Sempre termine com Marisa Monte.
Nascer no Brasil faz parte de um projeto de evolução espiritual que indiano nenhum estaria pronto para. O cancioneiro brasileiro é de partir o coração and I think it is beautiful.
Talvez eu devesse chamar esse texto de “Jamais dedique uma música a um momento”. Mas tenho andado tão sozinho nos últimos meses e com muita dificuldade em reconhecer algo que me dê prazer. Sentindo a felicidade cada vez mais longe, eu sinto meus olhos repletos de lances de amor. Mas o que eu teria a contar não é muito nem pouco.
A parte que o sol me ensinou é que a vida é amiga da arte. E para além, o tempo não para, nunca parou mas nunca pariu. No fundo de cada vontade, em cada ausência minha, há uma ânsia pela força estranha mas me falta a voz tamanha. Confesso que não sei se foi por excessos de demanda ou inanição por falta de punção de vida, mas eu e a vida se ausentamos um do outro e reproduzi isso em muita gente - tenho pedidos de perdões imensos a fazer que ainda não tive força.
Talvez eu ainda volte desse meu retiro espiritual - como me referi ao meu isolamento de começo de ano - e precise de uma reabilitação social, reaprender a viver sem o apavoro da angústia e voltar a ser mais feliz. Cabe a mim reconhecer a queda, não desanimar e dar a volta por cima - e ao meu psicanalista parar de cortar minhas sessões pela metade.
Longe do coitadismo da minha existência, mas o que eu passei nesses primeiros 5 meses de ano foi de uma brutalidade atroz. Formalizado na certidão final emitida no último sábado e cristalizado num diagnóstico que só saiu na quarta anterior. Vítima de uma moléstia motora paralisante, me despedi de minha avó no conta gotas. Todo dia parecia ser o último daquela relação tão linda que só João e Maria poderiam ter.
Eu entendi a angústia homogeneizante. E nela, eu decidi que precisava de uma música para viver aquele momento. Conformado com o que o futuro me esperava, passei o começo de abril com a certeza e a ansiedade da Simone falando que a cigana leu o destino e ainda mais nervosa cantando “o que será o amanhã? como vai ser o meu destino”. Impossível sofrer com essa, deveria me tirar da fossa IMEDIATAMENTE.
Até que eu meus desgraçadamentes tiveram a genial ideia de embalsamar minha abuelita em Eternamente da Gal Costa. Aqui eu devo confessar que eles foram de um repertório imenso, uma grandeza faraônica em descolar o romântico e me situar nessa comédia - que as melhores são sempre as mais tristes. Vamos combinar que limitar “pois tudo que é amor parece com você” a uma relação de ânsia entre sexos é de uma pobreza espiritual limitante até mesmo para o mais liso dos cérebros.
E no meio disso tudo, eu deixei a porra do fone de ouvido em São Paulo e tive que passar tudo no mudo. Eu servi água no meu próprio chope. Limitei meus momentos musicais à quanto estava defronte ao meu PC e desabituei a ouvir músicas sem fones, como sempre, eu mesmo me fodi.
Anteontem, domingo, ainda respirando entre um soluço de choro e outro, lidando com o vazio de desejar voltar pro útero por tamanha pequenez e solidão, encarei o céu e liguei o som do telefone mesmo - que inclusive, Steve Jobs estaria orgulhoso em como essa porrinha ficou com um som tão violento. O sagrado se revelou a mim com a grandiosa e eterna, verdadeira música de recuperação e acalento do nosso cancioneiro. Nesse momento, eu largaria tudo para fumar um com a Marisa Monte. Caso ela fumasse e se ela quisesse. Imagina enlutar-se sem saber que coisas vão se transformar para desaparecer?
Imediatamente, eu vi um menino correndo e eu pus os meus pés no riacho. Não demorou muito para a água me contar os seus segredos, trouxe e levou meus medos, refez o meu desenho.
Enfim, eu só queria dizer para você que tudo passa. O quarto ao lado é um estado de espírito, não uma sentença e que você confie nos seus desgraçadamentes, eles podem ser honestos. Pela primeira semana desde novembro, posso dizer que sou formado mais de água que angústia. Pode colocar meia dúzia de Brahma pra gelar que eu to voltando. Se tem uma coisa que brasileiro sabe fazer é sentir e beber.